Professor cria conceito que critica práticas sustentáveis atuais
Na semana passada, a entrevista do químico alemão Michael Braungart ao Jornal o Globo chamou a nossa atenção. É que Michael criou um conceito para prédios verdes, no qual acredita que tudo (absolutamente tudo) que é produzido pelo homem deve ser feito a partir de materiais que possam ser reutilizados em ciclos infinitos ou que se decomponham naturalmente se transformando em fertilizantes, para assim não causar qualquer dano ou impacto negativo na natureza.
Batizado de “Cradle-to-cradle” esse conceito para prédios verdes acabou se tornando um livro muito aclamado pela crítica e fãs da ideia do autor. Nesta entrevista ao Jornal O Globo, o professor e químico Michael Braungart falou sobre questões polêmicas que envolvem o dia a dia de prédios verdes: gestão de resíduos, ciclo de vida dos materiais e é claro, sustentabilidade. Confira abaixo:
O GLOBO: O senhor acha que o mundo avançou na questão da sustentabilidade nesses 12 anos que se passaram desde que escreveu o livro “Cradle-to-cradle”?
Michael Braungart: A maneira como a gente vê a sustentabilidade hoje tem mais a ver com fazer “menos mal” do que com ser realmente bom. A maioria dos projetos sustentáveis são focados na redução de perdas de produção, do consumo de água e energia, assim como no uso de novos materiais que minimizam o esgotamento dos recursos. Mas, a química desses novos materiais pode ser igual e até pior que de suas antigas versões. Isso é uma ameaça para a nossa saúde e para o meio-ambiente. O objetivo não deveria ser causar menos impacto, mas causar um impacto positivo. Mas, acredito que sim, nós avançamos. E estamos nos encaminhando para uma nova revolução industrial, na qual o conceito de cradle-to-cradle conduz a um movimento crescente dedicado ao desenvolvimento seguro de materiais e produtos.
O GLOBO: Então, aplicar o conceito de cradle-to-cradle seria uma questão de sobrevivência…
Michael Braungart: Temos que nos preocupar com os materiais que usamos tanto como nos preocupamos com o consumo de água e energia ou a emissão de carbono. Essas são questões importantes, claro, mas não deveriam ter mais importância do que a qualidade do ar dentro dos prédios, por exemplo, pois isso influencia diretamente a saúde de seus ocupantes. E os arquitetos vêm usando materiais dos quais não temos informação suficiente para saber que tipo de riscos podem trazer para a nossa saúde e para o meio-ambiente.
O GLOBO: Como o senhor vê a questão da gestão de resíduos atualmente?
Michael Braungart: Na natureza, resíduo é comida. Tudo é nutriente para alguma outra coisa. Entender como funcionam os processos naturais permite que arquitetos e designers reconheçam que qualquer material pode ser visto como um “nutriente”. Então, nossa produção não deveria ter nenhuma perda ou desperdício. O design cradle-to-cradle tem uma filosofia completamente diferente. Ele é baseado no ciclo natural dos nutrientes. E na natureza, não há perdas. Os processos atuais de reciclagem são downcycling, ou seja, reduzem a qualidade do material durante vários ciclos de vida até que ele não tenha mais utilidade. Por isso defendo o upcycling, que é o reuso dos materiais na criação de novos produtos, depois de sua vida comercial. Com isso, eles podem circular na indústria indefinidamente.
O GLOBO: O Brasil não tem uma política de análise do ciclo de vida dos materiais. Essa não deveria ser uma preocupação tanto das indústrias quanto dos governos?
Michael Braungart: É muito importante analisar o ciclo de vida dos materiais e é essencial que a gente os devolva à indústria, para que sejam aproveitados. Para que isso aconteça, governos, indústrias, designers e consumidores precisam entender que tudo aquilo que usamos hoje deve ser apto a retornar à indústria indefinidamente. Chegou a hora de adotar estratégias que resolvam o problema em vez de simplesmente aliviar as questões associadas à produção.
O GLOBO: O senhor é um crítico da arquitetura que é reproduzida da mesma forma em qualquer cidade do mundo…
Michael Braungart: Variação e diversidade podem não ser eficientes, mas são extremamente eficazes. O conceito de cradle-to-cradle é justamente sobre eficácia e benefícios. Nós não pensamos em desperdiçar menos ou causar menos efeitos negativos. Pensamos em causar impactos positivos. Imagine, por exemplo, prédios que produzam oxigênio, sequestrem carbono da atmosfera, purifiquem a água, use, a energia solar como “combustível” e sejam bonitos. Uma árvore faz isso.
Um tanto quanto radical a visão de Michael né? E você, acredita que os prédios verdes precisam seguir este padrão criado pelo químico, em que tudo deve ser reaproveitado? Deixe sua opinião nos comentários!
*Fonte: Jornal O Globo